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O exemplo da Colômbia: um convite à ousadia

Ana Penido*

O povo colombiano elegeu, em 19 de junho de 2022, seu novo presidente, o senador Gustavo Petro, ex-guerrilheiro; e sua nova vice-presidente, Francia Márquez, mulher negra, ativista ambiental e defensora dos direitos humanos. Formou também uma das maiores bancadas de esquerda da história do país, além de reduzir o espaço do uribismo, que dominava a política há 20 anos. O contexto eleitoral foi de aumento da violência política e social em níveis anteriores aos dos acordos de paz, com ampla atuação de grupos paramilitares. Desde o início de 2022, 76 lideranças políticas de esquerda foram assassinadas

Petro e Márquez tomaram posse dia 07 de agosto de 2022, em cerimônia que contou com a presença da ex-presidenta brasileira Dilma Rousseff. No dia 19 de agosto, o presidente fez seu primeiro discurso direcionado aos militares colombianos, durante a posse do Major-General Henry Armando Sanabria Cely como novo Diretor Geral da Polícia Nacional Colombiana. Dada a importância da fala e o desejo de ampliar sua circulação, o discurso foi traduzido a seguir e aqui é sumariamente comentado.

Inicialmente, alguns possivelmente estejam se questionando: ‘Por que trazer um discurso presidencial feito em uma atividade policial na Colômbia para a reflexão sobre as relações entre as forças armadas e a sociedade no Brasil?’ 

A Colômbia é um grande exemplo da policialização das forças armadas e da militarização da polícia nacional, consolidadas por décadas sob os auspícios estadunidenses. A Polícia Nacional colombiana está, desde 1953, subordinada ao Ministério da Defesa junto à Marinha, Exército e Força Aérea. Sua principal atividade é o combate ao narcotráfico no meio urbano e rural, uma atualização da Doutrina de Segurança Nacional que identifica entre os cidadãos colombianos inimigos potenciais. 

O país reúne uma combinação explosiva: movimentos insurrecionais, paramilitares, um recente acordo de paz, assassinatos de lideranças políticas, alta injeção de recursos pelos EUA, grandes organizações criminais com atuação internacional, décadas de governos neoliberais e índices de desigualdade social elevados. Nesse sentido, a Colômbia representa talvez a pior correlação de forças possível no continente para reformas na área de segurança.

Mesmo com o campo minado, Gustavo Petro, primeiro presidente do país com origem política na esquerda, vem fazendo e propondo mudanças profundas. Junto ao seu Ministro da Defesa, Iván Velasquez, enviaram para a reserva um grande grupo de oficiais, em torno de 24 generais da Polícia, 16 do Exército, 6 da Aeronáutica e 6 da Marinha, promovendo com isso uma ampla renovação da cúpula militar. Petro afirma que as forças militares na Colômbia precisam se tornar um Exército da Paz, e vem abrindo caminho doutrinário e prático nesse sentido.

Em termos de doutrina, Petro propõe a adesão ao conceito de segurança humana, que toma o indivíduo como centro, e não o Estado, por exemplo. Num enfoque mais restrito, o conceito trata de fatores que ameaçam a segurança física do indivíduo, como conflitos armados. Num enfoque mais amplo, trata de fatores que ameacem o bem estar, o desenvolvimento e a dignidade do ser humano, como fome, doenças, etc. O conceito é parte do alargamento pós Guerra Fria dos Estudos de Segurança. Foi usado em 1994 em documentos do PNUD, que pensou a segurança humana como um estado livre do medo e livre das necessidades, organizadas em sete categorias: econômica, alimentar, saúde, ambiental, pessoal, comunitária e política. Em outros termos, a segurança não seria a ausência de conflito armado, mas um estado em que os direitos básicos individuais e coletivos são garantidos para o desenvolvimento humano com liberdade (Sen, 2000). 

O conceito não é livre de controvérsias, e seu emprego na América do Sul exige cautela. Uma crítica que recebe é a sua amplitude, assim como a ausência da análise da interação entre os diferentes fatores de segurança com seus diferentes pesos (Krause, 2013). Outra crítica pertinente é que a securitização de temas em nível internacional abre a possibilidade de respostas militares para muitas questões, por exemplo, intervenções humanitárias em países subdesenvolvidos para resolver problemas de pobreza, legitimando os interesses de grandes potências (Duffield, 2017). Os EUA e a OEA nos anos 2000 classificam uma infinidade de ameaças, indo do terrorismo à pobreza. Entretanto, a pobreza, longe de ser uma ameaça, é um indicativo inequívoco da incapacidade de distribuir riquezas (Saint-Pierre, 2012). Com seus limites, é um conceito extremamente avançado para o histórico colombiano, marcado pelo enfrentamento à guerrilha política e ao narcotráfico. 

Petro começa o governo partindo das perguntas corretas. Ao invés de discutir apenas reformas nos meios militares, questiona o que e quem de fato ameaça a sociedade colombiana na atual quadra histórica global. Tendo essas questões claras, passa ao debate de como defender a sociedade, para só então propor para discussão pública (algo raro e salutar para forças de segurança) alterações organizativas e regulatórias. Em seu discurso, Petro propõe reformas concretas e profundas na organização militar, como a equidade de gênero, o aumento da escolaridade, mudanças orçamentárias, e mesmo a porta de entrada única para a carreira na Polícia Nacional, com profundos impactos na hierarquia e na disciplina. 

É cedo para avaliar o sucesso ou o fracasso de cada medida sugerida pelo novo presidente. Entretanto, levando em conta o cenário adverso que ele encontra, é inegável o quanto suas proposições de reformas são corajosas. Entendemos que algumas das propostas do novo presidente deveriam ser objeto de discussão também no Brasil, notadamente a problematização sobre o que de fato ameaça o povo brasileiro. Que a tradução desse discurso inspire as forças progressistas que atualmente disputam o processo eleitoral à ousadia.

Referências:

PAIVA, Giovana. Verbete: segurança humana. In: SAINT-PIERRE, H.; VITELLI, M. Dicionário de Segurança e Defesa. São Paulo: Editora Unesp Digital, 2018.

DUFFIELD, M. Human Security: Linking Development and Security in an Age of Terror. In: KLINGEBIEL, S. (Ed.). New Interfaces between Security and Development: Changing Concepts and Approaches. Bonn: German Development Institute, 2006.

KRAUSE, K. Critical Perspectives on Human Security. In: MARTIN, M.; OWEN, T. (Eds.). Routledge Handbook of Human Security. London; New York: Routledge, 2013.

SAINT-PIERRE, H. L. El concepto de la seguridad muldimensional: una aproximación crítica. In: ALDA, S.; GÓMEZ, V. (Eds.). El concepto y las relaciones multilaterales de seguridad y defensa en el contexto de la Unasur. Madrid: Instituto Universitario General Gutiérrez Mellado; Uned; Ministerio de Defensa Nacional de Ecuador, 2012.

SEN, A. Desenvolvimento como liberdade. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

Ana Penido é doutora em Relações Internacionais pelo Programa San Tiago Dantas (UNESP – Unicamp – PUC-SP). Pesquisadora do GEDES e do Instituto Tricontinental.

Imagem: Foto de Gustavo Petro no dia da posse presidencial/ Por: USAID/Wikimedia Commons.

 


Discurso do presidente Gustavo Petro, novo presidente da Colômbia, durante a cerimônia de nomeação do Major-General Armando Sanabria Cely para o cargo de Diretor Geral da Polícia Nacional da Colômbia

19 de agosto de 2022

Traduzido por Ana Penido

A todas as mulheres e homens da Polícia Nacional que nos acompanham, comissários, subentendentes, entendentes, oficiais. À Vice-presidenta da República Francia Márques Mina; ao Ministro da Defesa, Iván Velásquez; ao núncio apostólico em sua Santidade e ao decano do corpo diplomático, Monsenhor Montemayor. Aos altos comandantes militares e da Polícia Nacional e às suas famílias. Ao Major-general Elder Bonilla, comandante das forças militares e sua esposa, María Victoria. Ao Major-general Luiz Maurício Ospina Gutiérrez, comandante do Exército Nacional, e sua esposa Lorena. Ao Vice-almirante José Joaquín Amézquita García, chefe do estado-maior conjunto das forças militares. Ao Vice-almirante Francisco Fernando Cubides, comandante da Marinha Nacional, e sua esposa Luci. Ao Major-general Luis Carlos Córdoba Avendaño, comandante da Força Aérea Colombiana. Ao Major-general Armando Sanabria Cely, diretor geral da Polícia Nacional, e sua esposa Maria Fernanda. Ao Brigadeiro-general Carlos Fernando Triana Veltran, diretor da Escola de Cadetes de Polícia Diretor Francisco de Paula Santander, e sua filha Camila. Aos embaixadores e chefes de missões diplomáticas na Colômbia. Aos ministros e ministras, funcionários do governo nacional. Ao fiscal geral da Nação, Francisco Barbosa Delgado, e sua esposa Hualfa. À Prefeita da cidade de Bogotá, Claudia Hernández. Ao General Jorge Luis Vargas Valencia, diretor geral da Polícia Nacional, e sua esposa Cláudia. À representante da Câmara, Susana Gómez. Aos militares, almirantes, diretores de unidades da polícia, suboficiais, alferes, cadetes, oficiais do nível executivo, patrulheiros, etc. Representantes da comunidade inter-religiosa, aos convidados especiais dos meios de comunicação e à cidadania que se faz aqui presente. Saúdo a todos e todas nesse ato oficial para a transmissão do Comando, no qual quero expressar alguns conceitos, algumas ideias, para a discussão pública e para a análise da instituição. 

Durante a campanha eleitoral, o tema da segurança na Colômbia foi tema de exame em muitos fóruns, eventos e debates televisivos, e obviamente o das instituições que a garantem. Dizíamos que o conceito de segurança precisava ser transformado no país, pois o que se usava falhou de maneira enorme, levando instituições a quebras significativas da ética e dos direitos humanos.

Propusemos, e é o que propomos agora, mudar o conceito para a segurança humana. A segurança humana não é uma invenção minha, mas uma discussão mundial, cujo cenário são as Nações Unidas. A diferença não é apenas de palavras fáceis de pronunciar, colocando adjetivos à palavra segurança. A segurança humana basicamente muda o objetivo, o conceito mesmo, a essência do que até agora se vinha fazendo sobre o tema.

Temos medido a segurança por baixas: quantos mortos, quantos presos. Dia a dia, a televisão nacional apresenta balanços com esse objetivo, mais ou menos parecidos com os balanços que me eram apresentados quando prefeito dessa cidade, tratavam do mesmo tema. E, não obstante, mortos atrás de mortos, baixas atrás de baixas, neutralizações após neutralizações, os indicadores de segurança não melhoraram. 

Ao contrário, muitas regiões do país estão hoje sob o controle de grandes organizações multicriminosas, assim as chamaremos. Máfias lhes chamaríamos mais popularmente, mas estas máfias também se transformaram ao longo dos anos e das décadas. Hoje, o melhor termo que podemos usar são organizações multicriminosas, pois não apenas se dedicam ao narcotráfico, como também podem estabelecer em uma região, em uma parte da cidade, controles não apenas para as drogas e os entorpecentes, mas construir rotas para exportá-las e para o microtráfico, o consumo interno. Passam também a extorquir de forma generalizada bairros inteiros, zonas inteiras das grandes cidades, comarcas rurais inteiras. Não só a extorsão, mas também o sequestro, uma atividade de rendas ilegais que faz com que a sociedade fique submetida, fique sem direitos, fique sem liberdades em muitas regiões da Colômbia. Esses indicadores, reflexo da realidade, aparecem no aumento dos massacres, no aumento dos assassinatos de líderes sociais, no aumento de assassinatos de ex-combatentes, no aumento dos assassinatos em geral, cometidos durante o roubo de um celular por um garoto simplesmente para levá-lo de presente para a namorada. Mesmo com o enfrentamento do crime, temos uma realidade em que a tranquilidade cidadã não aumentou. 

Nós queremos propor, então, o conceito que se baseia não no número de baixas, no número de mortos, mas no aumento da vida. É o que chamamos segurança humana. Como em um território concreto, urbano ou rural, em uma jurisdição policial nesse caso, das 34 que existem, o que aumenta é a vida, e não a morte. O que diminui são os massacres, e o que cresce é o desfrute pleno da existência. Como diminuir não somente os riscos causados por um ser humano a outro ser humano, mas também os riscos que incluem a natureza, produto também da ação do ser humano? Como diminuir o risco de inundações, ou o risco de que alguém morra em uma inundação? Como diminuir o risco de morrer, para o conjunto da sociedade? Disso se trata a segurança humana. Portanto os indicadores não são mais o das baixas, mas o das vidas. Os indicadores para avaliar a perícia e o comando, homem ou mulher, de um oficial, de um comissário, um superintendente ou outras funções, deveriam ser sobre como salvar a existência humana. 

Como diminuir os riscos de morrer, o que inclui o desmantelamento das organizações multicriminosas? Grandes organizações que, há algumas décadas, nem sonhávamos que poderiam aparecer na Colômbia ou na América Latina. Organizações que apareceram, pois mudou o contexto da sociedade mundial e da economia mundial. O novo contexto da economia mundial de expansão dos mercados gera oportunidades para múltiplos crimes que se podem coordenar desde que exista uma organização que as planeje. Crimes que se tornam internacionais, crimes que atravessam as fronteiras, e que inclusive podem ocorrer ao longo da América. Como não reconhecer que a taxa de homicídios em diversos países latino-americanos em geral, em diversas cidades latino-americanas onde estão hoje algumas das cidades mais violentas do mundo, algumas delas colombianas, as taxas não estão caindo? É o produto de organizações que se movem na escala americana e que podem perfeitamente unir verticalmente, como dizem os gerentes das empresas privadas, podem unir o crime desde a produção da matéria prima, como quando se trata de drogas, até o produto acabado enviado para o consumidor final nos países ricos, nos quais estão os maiores consumidores. Quantos milhares de quilômetros não atravessam esses crimes, quantas realidades sociais vão navegando. Assim como atravessam rios e oceanos, atravessam seres humanos, sua diversidade, seus conflitos, seus problemas, suas necessidades. As organizações multicriminosas aprenderam a navegar nas sociedades das Américas, inclusive, se olhar ainda mais adiante e examinarmos as rotas que atravessam a África e chegam à Europa, veremos também a ampliação dos diferentes conflitos armados na África Subsaariana, na África Árabe, no Sul do Mediterrâneo, nos portos e máfias europeias.

Como enfrentar isso? Como enfrentar desde uma instituição nacional, subordinada à Constituição de 1991 e à sociedade colombiana?

Creio que estamos diante de problemas mais complexos do que a velha Doutrina de Segurança Nacional assentada na falsa crença de que existe um inimigo interno na Colômbia; de que alguém confabula em Marte ou em alguma parte do planeta sobre como causar danos a nós. Não existe inimigo interno na sociedade colombiana. Existem pessoas que sofrem de maneira diferente as circunstâncias em que vivemos nesse país e nesse território concreto. Algumas muito fortes, algumas com possibilidades, algumas com privilégios, algumas com várias capacidades e resistentes. Outras não, outras muito frágeis, territórios excluídos a quem só chegou a Polícia ou o Exército, mas nunca chega o médico ou a médica, o psicólogo, ou sequer a comida. Como enfrentar então essa poderosa organização multicriminosa?

A segurança humana pode construir instrumentos que blindem a sociedade colombiana. Se nosso povo não tem fome, existirão menos crimes. Se nossos jovens puderem entrar em uma Universidade em Catatumbo, Tumaco ou Letícia, onde só 8% dos meninos e meninas podem entrar em uma Universidade. Se conseguirmos que a juventude em Catatumbo consiga ingressar na Universidade, haverá menos crime. Se conseguirmos que um jovenzinho desses bairros aqui perto tenha como levar um celular para a namorada, haverá menos roubo, afinal não temos que discutir os presentes entre namorados em termos criminais. Se conseguirmos que uma série de atividades da sociedade colombiana que hoje são consideradas criminosas, não sejam mais assim consideradas, haverá por definição menos crimes na Colômbia. Quantas coisas criminalizamos que não deveríamos criminalizar! Desde quando um camponês que planta folha de coca é um criminoso? Ele é um simples camponês que não tem mais o que cultivar, pois se ele quiser produzir milho, é uma produção tão cara que não conseguiria sustentar a sua família. Desde quando é um criminoso um jovem que consome drogas, e que deveria ter na verdade acesso a um médico? Creio, portanto, que devemos construir um conceito diferente de segurança humana. Escolher bem quem é que se precisa enfrentar. Não é o pobre, mas a poderosa organização multicriminosa. 

E nessa perspectiva então devemos recordar a Constituição de 1991, que diz que a força policial, a instituição, é uma força armada civil, para garantir os direitos e as liberdades de todos e todas os colombianos. Esse é o conceito que está na Constituição, mas na história do país ele não foi concretizado profundamente. Claro, alguém poderia dizer que é por causa do que diz a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que a polícia não deve pertencer ao Ministério da Defesa, o que é uma discussão pública, e a faremos entre nós, entre vocês, o que significa essa opção. Que a polícia deixe de ser um corpo militar em alguns dos seus aspectos, pois a organização multicriminosa não é uma organização militar, como foi a guerrilha, a insurgência e várias das organizações mafiosas que aqui se instalaram. Mas a organização multicriminosa responsável pela insegurança cidadã em muitas regiões da Colômbia não é uma organização militar, então como poderia ser destruída com instrumentos militares?

Se a finalidade da venda de cocaína é ganhar dinheiro (para que mais se venderia cocaína?), e o recurso proveniente da venda da cocaína circula na nossa economia nacional através de megaoperações para a lavagem de ativos, como, através de instrumentos militares, se poderia destruir uma organização para a lavagem de dinheiro? Para destruir uma organização dessas precisamos de       computadores, experts em engenharia financeira, expertas em inteligência policial, expertas em transações bancárias a nível mundial. Uma quantidade de capacidades que não se pode caracterizar como militares, e sim como civis, e que precisam ser adquiridas através do estudo, para atingir a mesma altura das organizações multicriminosas, pois elas têm o dinheiro para recrutar os melhores experts civis na matéria da lavagem de dólares. 

Muitas vezes apresentamos na televisão habitantes dos bairros populares, por vezes até camponeses, dedicados ao microtráfico e outras atividades ilícitas. Mas quantas vezes foram apresentados os grandes lavadores de dólares da Colômbia, do México, da América? Onde eles vivem? Quais são seus bairros? E de que maneira poderemos levá-los à justiça para que sejam julgados?

Aqui temos um longo caminho por percorrer que tem a ver com a instituição policial. Aquilo que nos proporcione fazer crescer a segurança humana, e desmantelar as organizações multicriminosas. A verdade é que a polícia precisa crescer muito em termos de capacidades. E uma discussão é pensar como um homem ou uma mulher de 19 ou 20 anos que ingressa na instituição pode desenvolver essas capacidades, quando vem também de um mundo com problemas, de uma sociedade com problemas e profundamente desigual.

Creio que parte da transformação não tem a ver simplesmente com a decisão de transferir a Polícia de um ministério para outro, mas é algo mais profundo. Se o ser humano que conforma a instituição, porque a instituição não é uma abstração vazia, jurídica, mas sim é composta por pessoas, se essas pessoas podem gozar com plenitude seus próprios direitos e liberdades. Estou absolutamente convencido de que uma pessoa que esteja dentro de uma instituição policial gozando da sua dignidade humana dentro da instituição, não é capaz de violentar a dignidade humana de uma pessoa fora da instituição. Estou convencido de que quanto mais cresça a dignidade humana na Polícia, mais cuidado terá a Polícia Nacional com o conceito e a realidade da dignidade humana fora da Instituição Policial, nas veredas e nos bairros populares.

A Polícia Nacional não é para perseguir jovenzinhos nos parques. A Polícia Nacional não é para apreender uma banca de alimentos de um vendedor ambulante que vive quase exclusivamente disso. A Polícia Nacional não é para chegar à casa de um camponês e arrastá-lo para prisão porque ele cultivou folhas de coca. 25% dos presos são camponeses colombianos. A única coisa que isso provoca são as guerras secretas e clandestinas nos bairros, uma confrontação crescente e permanente entre cidadãos jovens e jovens policiais. Essa não é a nossa guerra. Assim a Colômbia não está sendo construída, pelo contrário, pode estar sendo destruída. Algo que aconteceu há alguns meses e marcou esse país política e socialmente, e isso não deve se repetir. 

A Constituição de 1991 é clara. A Polícia é para a defesa dos direitos e das liberdades de todos e todas as cidadãs. Inclusive os que são oposição a esse presidente e não votaram nele, há que cuidá-los e cuidá-las. Sobretudo da gente humilde e pobre, pois estamos em uma das sociedades mais desiguais do planeta Terra. Isso implica em um Estado que dê a mão firmemente ao que mais sofre, ao mais excluído. À mulher campesina, à mulher negra, ao jovem que é perseguido na realidade por diversas exclusões na sua existência, e que perde as esperanças, e crê que não há possibilidade nessa pátria, e então aceita dois ou três milhões para carregar um fuzil, sendo a carne de canhão das organizações multicriminosas.

Eu creio, e o pedi ao Ministro da Defesa e ao novo Diretor de Polícia que hoje iniciam seus trabalhos, que temos que fazer reformas. Não vamos falar de todas elas aqui, pois está prestes a cair uma grande chuva fruto da crise climática, não vamos analisá-las todas a fundo, mas eu proporia duas, ou três.

A primeira, já em parte alcançada, não sem problemas, pois tudo tem problemas, na Polícia Nacional, foi a igualdade entre homens e mulheres na prática cotidiana, precisamente para que na nossa sociedade a igualdade entre homem e mulher seja uma prática cotidiana [palmas]. Sociedades que culturalmente foram machistas por séculos, em que todos os homens foram educados assim, o machismo persiste na cabeça mesmo inconscientemente. Temos que fazer esforços institucionais para que a mulher possa estar em qualquer instituição, em qualquer parte, incluindo a polícia. Aqui foram feitos esforços e seus resultados são visíveis. Um desfile desses há vinte anos não seria assim, creio eu. Há avanços, e eles precisam continuar. O papel da mulher na polícia deve ser fortalecido, protegido, cuidado. É preciso criar mecanismos de denúncia para casos de irregularidades, para que a mulher sinta que é na Polícia Nacional, talvez dentro de todo o país, o seu espaço mais seguro.

Segunda questão, há mundos sociais distintos. Um é o mundo do intendente e do patrulheiro, que pode chegar a comissário. O outro é o mundo dos oficiais. Esse é um tema que não é apenas da Polícia. Mas quando existem dois mundos diferentes, e passar de um mundo ao outro custa dinheiro, pode acontecer de a capacidade de comando se desfazer. Um comandante que come com os mesmos instrumentos a mesma comida que um patrulheiro, é um comandante melhor. Ele é mais respeitado, mais querido, menos distante. Hoje temos uma Estação de Polícia com 300 patrulheiros, e chega um subtenente que jamais foi patrulheiro na sua existência, então não sabe o que é isso, mas vem para mandar, se produz o choque, a debilidade do comando. Por isso me parece que os dois mundos devem unir-se. Significa dizer que qualquer patrulheiro possa ser general da República simplesmente por mérito e não porque teve dinheiro para fazer o curso [palmas]. O que custa para fazer os diferentes cursos, eu sei que não têm matrícula, mas o que se cobra pelo uniforme, pelos apetrechos, para uma pessoa humilde é difícil conseguir 10 milhões de pesos. Isso deve acabar, pois para isso há um orçamento nacional, e se são organizações públicas, tudo o que há deve ser pago com dinheiro público, e nesse sentido não deve haver cobrança para passar de um mundo para o outro. Estudar nas diferentes escolas da Polícia Nacional deve ser completamente gratuito para os membros da Polícia Nacional, esta é a primeira reforma que lhes proponho.

E que leva a um assunto complexo que quero lhes propor, e que quero que se debata com as bases mesmo dentro da Polícia, para que cheguem opiniões e propostas, pois isso leva necessariamente a que o mundo dos oficiais saia necessariamente do mundo de patrulheiros. Isso significa que não se chega ao Comando por uma porta externa da sociedade, mas pela porta da Patrulha. Que todos os membros da polícia tenham que ser patrulheiros e, através do mérito e de estudar, obviamente, possam ascender. É uma mudança que pode garantir um fortalecimento maior no comando e uma unidade maior na ação em diferentes lugares: que não haja diferenciação social na Polícia, e que qualquer um possa ser general se tiver mérito! Que não seja a condição econômica o que impeça uma mulher ou um homem dentro da Polícia a seguir a carreira até o final, até a cúpula, até que um dia um presidente o despeça com honras, pois acabou o seu ciclo diante da força policial. 

E uma segunda proposta, essa tem mais a ver com as forças militares nas quais as pessoas são mais transitórias do que aquelas da polícia. A polícia será melhor se todos os seus integrantes puderem elevar o seu nível de escolaridade. Quando eu falava sobre a organização multicriminosa dedicada à lavagem [de dinheiro], é preciso de inteligência financeira para descobrir as transações ilícitas que não são fáceis de descobrir, e isso implica em ampliar as capacidades profissionais que são diversas, e não são as mesmas exigidas para enfrentar um problema de gangues num bairro popular, onde é preciso entender a antropologia da juventude de hoje. Quando prefeito custei para entender o que dizia num mural da parede, até que descobri o que dizia. Mas para isso é preciso saber, conhecer. Se implementarmos um programa em que, o máximo possível, as pessoas que entram como patrulheiros ou patrulheiras da instituição possam começar juntando a sua atividade diária de trabalho com a educação superior em todas as disciplinas, o que faz com que, além de estudar aqui, é preciso abrir a porta da Universidade pública, e ampliar as escolas para promover a elevação do nível de escolaridade da Polícia até termos uma polícia melhor, mais capaz. Essas capacidades são fundamentais na hora de defender os direitos e as liberdades da cidadania. 

Uma pessoa que se aposente por qualquer motivo continuará capacitada para exercer sua profissão na sociedade colombiana sem decair. O que passa com um soldado que saiba manejar um fuzil, e sai da instituição para a sociedade? Ele não é mais um profissional, não lhe dão salário na força militar, ele vai pedir um posto de zelador em um edifício e não consegue, porque sabe manejar um fuzil. A instituição estatal tem que dar capacidades para esses jovens homens e mulheres que estão em instituições armadas, que têm conhecimentos específicos, mas que não se aplicam na sociedade, deve promover as capacidades também para se defender; de tal maneira que a passagem pela Polícia, pelo Exército, Marinha ou Aeronáutica, seja uma passagem que proporcione ao ser humano que ingressa, sair melhor do que quando entrou em todo tipo de capacidades humanas, o que inclui as capacidades acadêmicas e profissionais. 

Um corpo de Polícia mais profissional implica em dinheiro. O que pagava o patrulheiro, deve pagar o Estado; o que paga o cadete ou o alferes, deve pagar o Estado. A educação que teria que encontrar inclusive fora dessas instituições, quem tem que pagar é o Estado. Chegamos a prática de todo governante que é decidir o que é prioritário. Esse dinheiro pode estar sendo gasto em outras coisas. Pode ser que esteja dentro da Polícia, mas gasto em outras coisas. Pode ser que componha os gastos militares, mas gasto em outras coisas. Pode ser que esteja dentro do Estado, mas gasto em outras coisas. Pois eu lhes proponho que todo o gasto com seres humanos é prioritário! As coisas podem esperar, mas o ser humano não. A mulher e o homem que carregam o fuzil são mais importantes que o fuzil, sempre e em todo lugar. O fuzil não dispara sozinho, e inclusive pode ser autodestrutivo. Se o ser humano que está atrás desse fuzil for melhor, teremos mais capacidade, mais garantias de defesa. Uma Polícia que, como diz a Constituição, seja a garantia plena dos direitos e das liberdades da sociedade colombiana sem exceção, desde o mais pobre ao mais rico, mas sabendo que quem mais necessita é o mais pobre. 

Portanto, é a aliança Estado-povo, Exército-povo, Polícia–povo, Exército-camponês e camponesa, Polícia-jovem do bairro popular é fundamental estabelecer essa aliança se queremos uma democracia melhor, com mais tranquilidade, mais estabilidade, com desenvolvimento que alcance a toda a sociedade colombiana, para que este país seja muito maior do que é. Obrigado por terem me escutado, felicidades e um aplauso a vocês homens e mulheres da Polícia Nacional.

La relación del presidente Petro con la Fuerza Pública

Alejo Vargas Velasquez*

Texto publicado originalmente em Revista Sur.

Se ha especulado mucho sobre algo que es de rutina en los diferentes gobiernos al iniciar su mandato y que hace referencia al nombramiento por parte del Presidente de la República y su Ministro de Defensa de la llamada ‘cúpula’ de la Fuerza Pública y la salida a calificar servicios de otros altos oficiales que han cumplido su tiempo de servicio. Es decir, definir por el comandante supremo de la misma con qué línea de mando va a empezar a desarrollar sus políticas de seguridad y defensa.

Recordemos que un principio fundamental de la democracia (especialmente del modelo liberal de la misma) es la subordinación de los militares y policiales a los gobernantes civiles legítimos, porque han sido democráticamente electos. Esto transforma al Presidente de la República, en los regímenes presidencialistas, en el Comandante Supremo de la Fuerza Pública y por lo tanto con mandato constitucional y legal, para conducirlas y orientarlas, lo cual implica definir quiénes van a ser los colaboradores que estarán en el comando de la misma.

Podríamos recordar que el proceso de estructuración de las Fuerzas Armadas como institución nacional, profesionalizada e imparcial, como deben ser todas las instituciones estatales, pasó por varios momentos. Un primer momento el encarnado por el ejército que emerge en la post-independencia; un segundo, el de la fragmentación del mismo por causa de las guerras civiles del siglo XIX; un tercero, caracterizada por el paso de ejércitos difusos y espontáneos al embrión de un Ejército Nacional, luego comienza la profesionalización pero se mantiene el carácter de ejército adscrito o politizado, en el cual el partido transitoriamente en el gobierno quiere utilizarlo como un aparato al servicio del mismo, momento que con distintos altibajos se prolonga hasta la violencia liberal-conservadora de mediados del siglo XX; un momento en que se prioriza la despartidización de las Fuerzas Armadas y el Ejército se va delineando como un ejército contrainsurgente y finalmente evoluciona, sin perder el carácter anterior, hacia un Ejército Profesional moderno.[1]

La Fuerza Pública en toda sociedad tiene la misión de proteger la integridad territorial, la soberanía nacional y garantizar seguridad a todos los miembros de la comunidad política; por ello la Fuerza Pública configura una de las instituciones básicas en una sociedad. En el caso colombiano, por la persistencia de la violencia política ella ha tenido la responsabilidad de enfrentar y combatir con las organizaciones alzadas en armas, así como con los demás grupos armados ilegales. Eso implica que en un conflicto armado como el nuestro la Fuerza Pública ha tenido la responsabilidad, desde la institucionalidad, de enfrentar las organizaciones insurgentes y fue la reforma militar y policial de fines de los 90s, en el marco del Plan Colombia, que profundizó la orientación contrainsurgente del grueso de la Fuerza Pública, lo que influyó para modificar el escenario estratégico de la confrontación armada.

Pero igualmente es importante destacar que si bien la Fuerza Pública en una democracia debe ser una institución profesionalizada, que se rige por un sistema de carrera administrativa, éste llega en el caso colombiano, desde el grado de Subteniente – con el cual sale el joven oficial de la escuela de formación – hasta el nivel de Coronel, por cuanto la selección de aquellos oficiales que pasan al grado de Brigadier General para continuar su carrera, conlleva la intervención de varios mecanismos-filtro: la propia selección interna realizada por el cuerpo de generales, la intervención del Congreso de la República que aprueba o niega estos ascensos y en últimas el Presidente de la República que tiene la discrecionalidad para llamar a calificar servicios a quién él considere, junto con su Ministro de Defensa, a partir de su buen juicio.

Por consiguiente, el que al seleccionar el Presidente y su Ministro de Defensa la línea de mando, implique la salida a retiro de oficiales superiores –a quienes sin duda sólo queda darles los agradecimientos por los servicios prestados-, es algo normal y dentro de unas instituciones con una tradición civilista como en el caso colombiano no es de esperar sino el reafirmar la lealtad a la institucionalidad democrática, a su comandante en jefe y a sus nuevos mandos institucionales –como hemos visto lo ha reiterado claramente el Director saliente de la Policía Nacional General Vargas-. No creo que tenga sentido la preocupación de aquellos que dicen que se retiran los oficiales de mayor experiencia y que los que siguen en la línea de mando no la tienen; normalmente es desde el nivel de Coronel hacia abajo que se encuentran los oficiales con la mayor experiencia operativa y en muchos casos igualmente de planeación y estratégica, sin desconocer que es probable que entre los oficiales superiores que pasan a retiro van muchos con una gran experiencia acumulada, pero lamentablemente eso sucede en casi todas las organizaciones.

Recordemos que en Colombia sólo tuvimos en todo el Siglo XX, una interrupción del mandato institucional con el ‘golpe militar’ liderado por el General Gustavo Rojas Pinilla en 1953, dentro del contexto de una violencia bipartidista, liberal-conservadora, en proceso de agudización, a diferencia de la mayoría de países de la región con una alta tendencia de intervenciones militares y policiales en política. Esto dentro de una paradoja que ha caracterizado el sistema político colombiano, la escasa presencia de gobiernos militares a lo largo de su historia, conviviendo con una recurrente violencia de naturaleza política; lo anterior, sin embargo, salpicado reiteradamente por la recurrencia de pronunciamientos, conspiraciones, golpes de Estado o movimientos rebeldes militares y/o civiles del pasado y del presente, [2] o la presencia de ‘huelgas militares’ como las denomina Malcom Deas. [3]

Y esto va más allá de aspectos transitorios de carácter personal, como además lo hemos observado en varios países de la región, donde igualmente han llegado a la primera magistratura anteriores militantes de organizaciones insurgentes como en Uruguay y Brasil, donde es claro que una cosa es el pasado político del Jefe de Estado y otra su realidad y legitimidad actual y no la especulación que algunos han planteado por la militancia del actual Presidente, tres décadas atrás, en el desmovilizado movimiento insurgente M-19.

El otro aspecto que ha generado alguna controversia en medios de comunicación y en redes sociales es lo dicho por el presidente Petro en el sentido de modificar algunos de los criterios que normalmente los comandantes militares y policiales tienen para su evaluación de desempeño e introducir –no es claro si como sustitutos o complementarios de los que existían hasta el momento-, criterios como la no realización de masacres y la no existencia de asesinatos de líderes sociales o de desmovilizados de anteriores grupos insurgentes, en la jurisdicción bajo su responsabilidad, dándole de esta manera materialidad a una nueva doctrina de seguridad, fundada en la ‘seguridad humana’ donde la prioridad debe ser garantizar la vida de los ciudadanos y velar por el cumplimiento de los Derechos Humanos y del DIH. Por supuesto que esto debe conllevar los desarrollos normativos del caso al interior de las instituciones militares-policiales y de lo cual es ampliamente conocedor el actual Ministro de Defensa.

No se debe olvidar que en las urnas ganó un proyecto político democrático que planteó el Cambio como su eje estratégico y uno de los vectores del mismo, sin duda es la política de seguridad y defensa y el rol de la Fuerza Pública en el futuro inmediato, incluida el cambio de ubicación institucional de la Policía Nacional. Sin embargo, es importante destacar la preocupación válida de algunos sectores porque se mantenga la profesionalización y el apartidismo de la Fuerza Pública, que son algunas de las características de una Fuerza Pública moderna; debería abandonarse cualquier tentación de convertir a la Fuerza Pública en un apéndice del proyecto político en el Gobierno.

Lo anterior se sitúa en lo que podemos considerar como una modernización militar, entendida como la necesidad de colocar a las Fuerzas Armadas a tono con los tiempos –en los que sabemos el Presidente ha colocado como una de sus políticas prioritarias la de la ‘Paz Completa’ o ‘Paz Total’- e incorporar los cambios organizativos, estructurales, logísticos, de políticas de personal y de adquisiciones, dicho de otra manera, los cambios en la doctrina militar y la dimensión técnico-operativa, es una necesidad permanente para que una sociedad cuente con unas Fuerzas Armadas y de Policía legítimas, eficientes y eficaces.

Finalmente, debemos decir que tanto el presidente Petro como comandante supremo de la Fuerza Pública, así como el Ministro de Defensa, como delegatario del Presidente para la conducción de la misma, tienen el mayor respeto institucional por las Fuerzas y están actuando y lo seguirán haciendo con la mayor consideración, pero igualmente exigiendo resultados como se espera de cualquier institución del Estado.

Es verdad que un Estado tiene el derecho y el deber a fortalecer su capacidad militar, como un factor de disuasión tanto en lo interno como frente a hipotéticas amenazas externas, pero lo que es profundamente erróneo es creer que se puede renunciar a la dimensión política de la búsqueda de seguridad que es la negociación o la diplomacia (si se trata de problemas de seguridad externos). Por ello la búsqueda de la seguridad, en un caso como el colombiano, justamente pone en el primer lugar la solución política negociada del conflicto interno armado y otras expresiones de conflictividad, porque una respuesta efectiva a un problema de seguridad es la respuesta política, que en el ámbito internacional es la diplomacia y en lo interno la solución negociada de los conflictos.  Afortunadamente todo indica ese es el camino tomado por el Gobierno Petro.

Finalmente, la consolidación de una sociedad segura, apunta a resolver los problemas del desarrollo, como la pobreza, el desempleo, la marginalidad, que se pueden convertir en caldo de cultivo para distintas formas de violencia y de esta manera generar inseguridad. Por ello la mejor manera de consolidar la seguridad en una sociedad es combinar adecuadamente, un Estado fortalecido en el marco del respeto absoluto a la Constitución y la ley, un estímulo permanente a la solución negociada de los conflictos y políticas que apunten a resolver los problemas del desarrollo de la sociedad.

* Alejo Vargas Velásquez es Profesor Titular Universidad Nacional de Colombia y Director del Grupo de Investigación en Seguridad y Defensa.

Imagem: Posse de Gustavo Petro. Por USAID/Flickr.

[1] Vargas Velásquez, Alejo, “Hacia un Ejército Profesional Moderno en Colombia. La  lenta marcha en el Siglo XIX hacia unas Fuerzas Armadas Profesionalizadas”, en, REFORMA MILITAR EN COLOMBIA. Contexto internacional y resultados esperados, Alejo Vargas Velásquez y Carlos Alberto Patiño Villa, Editores, Colección Pensamiento Político Contemporáneo, Universidad Pontificia Bolivariana, Concejo de Medellín, Medellín, 2006. (pag. 120)

[2] Mayor ® BERMUDEZ ROSSI, Gonzalo, “Pronunciamientos, Conspiraciones y Golpes de Estado en Colombia“, Ediciones Expresión, Bogotá, 1997

[3] DEAS, Malcom, “Perspectiva histórica de las relaciones civiles militares en Colombia”, en, Las Relaciones Cívico-Militares en tiempos de conflicto armado, Fernando Cepeda Ulloa, Editor, Embajada de los Estados Unidos-Fundación Ideas para la Paz, Bogotá, 2003.

 

Colombia 2021: crisis y proyecciones

Gabriel Gaspar*

 

Colombia es sacudida desde hace días por masivas movilizaciones.  Su origen puntual fue el rechazo a una reforma tributaria que el Gobierno propició.  En forma súbita miles de manifestantes se lanzaron a las calles a protestar.  Todo en medio de un difícil momento de la pandemia que ya lleva mas de un año.

Las protestas no han cesado y hace rato que el  presidente Duque retiró el proyecto y que el ministro de Finanzas renunció.  Pero la protesta continua, con mas de una veintena de victimas, ciudades semiparalizadas, tomas de calles y caminos, carnavales pacíficos en el día, junto a graves incidentes en las noches, que incluyen asaltos a retenes policiales.  Por cierto, denuncias de violencia policial y de militarización de las ciudades y preocupación de la comunidad internacional.

A estas alturas, debemos asumir que si la reforma tributaria fue la chispa, se impone evaluar porque la pradera estaba tan seca lo que permitió su incendio.  Dada la cercanía de los hechos, solo podemos sugerir algunos factores que explicarían la actual crisis colombiana.

Ante ello proponemos cinco tesis sobre la crisis.

  1. El fin de la guerra

En los años precedentes Colombia asistió al final del proceso de paz, con la firma de los Acuerdos entre el Gobierno del entonces presidente Santos y las FARC.  Se puso termino al conflicto interno mas prolongado de América latina.  La firma de la paz no fue una perita en dulce, para empezar el referéndum convocado para ratificar los Acuerdos fue rechazado, y si bien luego se destrabo la aprobación, la implementación fue lenta y tortuosa, hasta la fecha.  Pero terminaron los combates, las FARC dejaron las armas y se incorporaron a la política como partido, donde hay que decir que a la fecha sus resultados han sido pobres, Naciones Unidas supervisó el proceso.  El conflicto armado concluyó en lo fundamental.

El nuevo escenario provocó cambios en el sistema.  Así como se desmovilizaron las FARC, también empezó a perder fuerza el discurso duro que explicaba todos los males del país por la presencia guerrillera.  Este tipo de posiciones fue liderada por ex presidente Uribe, que gobernó con férrea mano el país a inicios de siglo y conformó un partido: el Centro Democrático, que logró instalar al actual presidente Duque en el poder.

En un plano más subjetivo, la paz generó diversas y fuertes expectativas.  Para un sector del país el fin de la guerra y la guerrilla, iba a generar un escenario propicio para dar un gran salto al desarrollo, para otros, la paz implicaría el fin de la violencia y los abusos, la alegría ya venía.  Como resultó el proceso después de algunos años, lo veremos mas adelante, lo que destacamos acá es que imperceptiblemente el fin de la paz abrió espacio para una reformulación de la política y estimuló muchas expectativas.

  1. La persistencia de la violencia y la desigualdad

La firma de los acuerdos facilitó la desmovilización del grueso de las tropas farianas.  A lo largo de la guerra, las FARC fueron construyendo un verdadero Estado guerrillero en las zonas bajo su control, ubicadas en las regiones mas apartadas, montañosas y selváticas del vasto territorio colombiano.  En esas zonas las FARC ejercían el gobierno, administraban justicia, cobraban impuestos, mantenían el orden.  Al desmovilizarse y concurrir a los lugares de concentración, esos territorios fueron ocupados por las disidencias que nunca se unieron al proceso de paz, como el Frente 1 del Guaviare, comandado por Gentil Duarte.  Además de  estas disidencias, a las zonas vacías acudió el Ejercito de Liberación Nacional.  En los territorios que desocuparon los mas de 60 frentes de las FARC también se instalaron diversos grupos armados del  narcotráfico: los Rastrojos, el Cartel del Golfo, los Pelusos, entre otros, buscando controlar fronteras y corredores para sacar la droga.  En otras palabras, se instalaron todos, menos el Estado.

La violencia recrudeció por el control territorial.  Perdura hasta la fecha, inclusive varios de estos grupos incursionan y operan fuera de las fronteras, invadiendo territorio venezolano y ecuatoriano,  donde se instalan corrompen, extorsionan  y establecen todo tipo de alianzas que les facilite su operación.  A ellos se sumó la disidencia encabezada por el negociador de paz, Iván Márquez, acompañado por el Paisa, jefe de las tropas especiales de las FARC, estos abandonaron el proceso de paz y se realzaron y se identifican como FARC, Nueva Marquetalia.

Pero la violencia no es el único factor que perduró.  También lo hizo la profunda desigualdad social que impera desde hace mucho en Colombia, como en muchos otros países de nuestra región.  Según datos del Departamento Administrativo Nacional de Estadísticas, DANE, el 42,5% de la población colombiana se encontraba en condición de pobreza el 2020, un incremento de 6.8% en relación a 2019.  Es decir, 21,02 millones subsisten con menos de 331,668 pesos mensuales (hoy el dólar se cambia a 3.800 pesos aprox.)

  1. Pandemia no controlada

Colombia al igual que el resto de la región padece desde hace mas de un año de la pandemia del covid.  Las cifras al día de hoy son duras: casi tres millones de contagiados y mas de 76 mil fallecidos.  El ritmo de vacunación es bajo, a la fecha según datos del Minsal hay cerca de 5 millones de vacunados de los cuales 1.5 son con doble dosis.  A fines de abril las autoridades planeaban intensificar sus esfuerzos y llegar a los 9 millones de vacunados a fines de mayo, lo que obviamente será difícil en el actual cuadro.

Los colombianos, al igual que la mayoría de los latinoamericanos, están agotados de la cuarentena, perjudicados por la recesión, especialmente los trabajadores informales.  Un horizonte de pandemia interminable agobia a la población.

  1. Agotamiento temprano del proceso de paz

La paz llego, la mayoría de los guerrilleros y milicianos de las FARC, aproximadamente unos 12.000 combatientes se acogieron al proceso.  Pero el proceso empezó a ralentizar, los compromisos asumidos por el Estado en materia de apoyos a los ex combatientes, regularización de tierras, y otros pactados en las negociaciones se cumplieron parcial y lentamente, y algunos no se cumplieron derechamente.  Al asumir el gobierno del presidente Duque la desafección se incrementó, con un fuerte cuestionamiento de las autoridades hacia los mecanismos y potestades pactadas en la Justicia Especial para la Paz.  Pero lo peor es la gran cantidad de asesinatos de dirigentes sociales, lideres de  derechos humanos, representantes de desplazados y victimas desde el fin del conflicto.  Casi medio millar desde la firma de los Acuerdos, a los que hay que agregar cerca de 200 ex combatientes desmovilizados, la inmensa mayoría de ellos por sicarios, todo con una amplia impunidad.

¿Fue un fracaso el proceso?  Es temprano para dar un juicio categórico, pero es evidente que no todo lo que se pactó en las largas conversaciones en La Habana se cumplió.  Si se cumplió lo fundamental: el fin de las acciones armadas, el desarme de la guerrilla y su transformación en partido político. Una parte no medible de los desmovilizados volvió al monte, principalmente a la Nueva Marquetalia.

  1. Recomposición de la representación política

La Colombia del pos conflicto mantuvo algunas tendencias históricas, como la desigualdad social, pero también impacto a la política.  Durante buena parte del siglo XX el clivaje liberales vs conservadores perduró, pero el auge de la guerra a fin de siglo pasado posibilito la emergencia de un nuevo clivaje, donde el uribismo se ubico con fuerza vs el resto.  El fin de la guerra libró del problema que a la social democracia colombiana le creaban las FARC – algo parecido a lo que en su momento le creo Sendero a la izquierda peruana – y a su vez, fue dejando con poco proyecto al uribismo.

El presidente Duque esta a poco mas de un año de terminar, y se perfilan los presidenciables, donde destaca Gustavo Petro, ex militante del M 19, del izquierdista Polo Democrático después, ex alcalde de Bogotá.  Las encuestas le dan un 30% de apoyo y lo sigue con casi la mitad, el centrista ex gobernador de Antioquia, Sergio Fajardo.  La derecha de Centro Democrático pierde terreno, y lo mas probable es que eso se acentúe con estas movilizaciones.  La alcaldía de Bogotá la ganó Claudia López quien no oculta su condición de lesbiana. Las FARC han tenido un misérrimo resultado electoral. Continuidad y cambio en la Colombia de pos guerra.

A modo de conclusión

Fue en este apretado cuadro de frustraciones, cambios, expectativas no cumplidas y miedo y agobio ante la pandemia, en el cual el gobierno intento una reforma tributaria que subía los impuestos.  La reacción la conocemos por la prensa.

Las movilizaciones han agregado nuevos puntos a la agenda, imposibles de soslayar si se piensa en una solución: la investigación de los muertos y heridos de estos días, la responsabilidad política e institucional de todo ello, un examen a fondo de la Policía Nacional, principal responsable de las bajas según primeros informes.  Agreguemos que también hay heridos y fallecidos entre los uniformados.

El Gobierno ha convocado a un cronograma de diálogo, demasiado largo ante la urgencia y gravedad de los hechos.  El congreso cita al ministro de Defensa a dar explicaciones, los dirigentes sociales condicionan el dialogo al cese de la represión, el gobierno convoca al cese de toda violencia.  Los desordenes, en especial las tomas de carreteras y calles están provocando escasez y desabastecimiento, lo que agrava el drama de la pandemia.

La economía obviamente sufrirá mas.  Ojo para Chile: en Colombia están presentes mas de 120 empresas chilenas que en su conjunto han invertido mas de 19.000 millones de dólares.

En suma, la crisis esta en pleno desarrollo, su curso es incierto y llama a que todos los involucrados construyan con rapidez una salida.  De lo contrario están dadas las condiciones para una profundización.  Que decir si la crisis persiste y sus consecuencias económicas, sociales y migratorias.  Al lado de una Venezuela ya en crisis hace años, con un mundo andino convulsionado y un Brasil donde la pandemia contagió todo.

 

* Gabriel Gaspar fue viceministro de defensa de Chile, embajador en Colombia y embajador plenipotenciario para America Latina.

Imagem: Bogotá, Colômbia. Por Pedro Szekely.

Depois do Plano Colômbia: as novas relações EUA-Colômbia na área de segurança*

João Estevam dos Santos Filho**

 

Entre 2000 e 2016, os governos da Colômbia e dos Estados Unidos (EUA) mantiveram relações próximas na área de segurança, baseadas principalmente na execução do Plano Colômbia. Este foi um pacote de assistência norte-americana para a Colômbia proposto pela administração de Andrés Pastrana (1998-2002), inicialmente voltado para o desenvolvimento do país andino. Após as negociações entre os dois países em 1999, o programa entrou em vigor formalmente em 2000, mas passou a executado de fato a partir de 2001 (ROJAS, 2015).

Apesar de a proposta colombiana ter se focado na assistência ao desenvolvimento econômico e social do país, prevaleceu a norte-americana, cuja ênfase recaía sobre o combate às drogas no país. Segundo os argumentos do governo dos EUA, o enfraquecimento do narcotráfico na Colômbia levaria a um declínio dos grupos armados atuantes no país (PIZARRO; GAITÁN, 2006). Isso porque desde meados da década de 1990, as duas principais guerrilhas colombianas – as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e o Exército de Libertação Nacional (ELN) – começaram a fortalecer-se por meio de recursos vindos do narcotráfico (PÉCAUT, 2010).

Tendo contribuído para a modernização das Forças Armadas da Colômbia e para o enfraquecimento das guerrilhas – apesar de não ter sido eficaz no combate ao narcotráfico –, o Plano Colômbia foi encerrado em 2016, sendo substituído pelo plano Paz Colômbia, uma iniciativa norte-americana voltada para o apoio à implementação do acordo de paz assinado entre o governo de Juan Manuel Santos (2010-2018) e as FARC, em Havana. Apesar do fim desse que foi o principal programa de assistência de segurança na história das relações entre os dois países, isso não significou um distanciamento.

Nesta nova etapa, o que se vê, por um lado, é um foco nos aspectos qualitativos da assistência de segurança: treinamento e influência doutrinária das instituições norte-americanas sobre as Forças Armadas colombianas. Por outro lado, há uma tendência à desmilitarização da ajuda estadunidense. Apesar de o número de militares colombianos treinados por técnicos dos EUA não ter sido tão grande quanto no período que vai de 2001 a 2007, continuou em um patamar relativamente alto para a região, variando entre aproximadamente 4.000 e 2.000 militares.

Além disso, as Forças Armadas norte-americanas treinaram unidades colombianas importantes para o período pós-acordo, como a Escola de Missões Internacionais e Ação Integral, responsável pelo ensino de efetivos empregados em ações de auxílio a projetos de desenvolvimento socioeconômico (MOYAR; PAGAN; GRIEGO, 2014). Outro ponto importante é o apoio do Comando Sul dos EUA para que militares colombianos treinem forças de segurança de outros países a partir do modelo adotado durante a vigência do Plano Colômbia. O programa encarregado disso é o Plano de Ação EUA-Colômbia sobre Cooperação em Segurança Regional, assinado em 2012, tendo sido treinados 16.997 integrantes das forças de segurança de países da América Central e do Caribe entre 2013 e 2017 (TICKNER; MORALES, 2015).

Em relação à influência doutrinária dos EUA, esta pode ser vista a partir da presença de militares norte-americanos nos comitês das Forças Armadas colombianas encarregados da formulação da nova doutrina colombiana no período pós-acordo, chamada de Doutrina Damasco. Nesse sentido, técnicos do Exército dos EUA participaram do Comitê Estratégico de Desenho do Exército do Futuro, enquanto o Comando Sul auxiliou o Centro de Doutrina do Exército da Colômbia na elaboração do novo modelo doutrinário. Além disso, o principal conceito operacional dessa doutrina foi baseada em um dos manuais de campo do Exército norte-americano (ROJAS, 2017).

Por outro lado, as novas relações bilaterais passaram a ser menos baseada na assistência militar, voltando-se para a promoção de projetos de desenvolvimento socioeconômico em áreas antes dominadas pelas guerrilhas. Apesar de ter se iniciado no final do governo Bush (2001-2009), esse fato se consolidou com o governo Obama, através de iniciativas ligadas ao Departamento de Estado. Esse foi o caso do próprio plano Paz Colômbia, da Iniciativa de Desenvolvimento Estratégico da Colômbia (CSDI), com forte presença da Embaixada dos EUA na Colômbia e da Estratégia de Cooperação para o Desenvolvimento do País, executado pela USAID. Todos esses programas, embora com valores mais baixos que o Plano Colômbia, demonstram uma grande diferença com relação ao período de 1998 a 2010.

Portanto, apesar de as relações entre EUA e Colômbia terem passado por uma transformação que incluiu o fim do Plano Colômbia e a diminuição da assistência militarizada, o que se viu foi a continuação de uma relação próxima entre os dois países na área de segurança, sendo possível afirmar que a dependência do país sul-americano para com os EUA continua, por outras formas, adaptada ao contexto doméstico de ambos os países e à nova conjuntura internacional.

 

*  Esse texto é baseado no artigo intitulado “Relações militares entre Estados Unidos e Colômbia: do Plano Colômbia ao Acordo de Paz (2000-2018)”, publicado pela Meridiano 47.

** Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP). Membro do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (GEDES) e Pesquisador Associado do Instituto Sul-Americano de Pesquisa e Estratégia (ISAPE).

Imagem por: Southcom media.

 

Referências bibliográficas

BEITTEL, June S.. Colombia: Background and U.S. relations. Washington, D.C: Serviço de Pesquisa do Congresso, 2019.

MOYAR, Mark; PAGAN, Hector; GRIEGO, Will.. Persistent Engagement in Colombia. Florida: JSOU Press, 2014.

PIZARRO, Eduardo; GAITÁN, Pilar. Plan Colombia and the Andean Regional Initiative: lights and shadows. In: LOVEMAN, Brian (Ed.). Addicted to failure: U.S. security policy in Latin America and the Andean region. Lanham: Rowman & Littlefield Publishers, 2006. p. 53-79.

PIZARRO, Eduardo; GAITÁN, Pilar. Plan Colombia and the Andean Regional Initiative: lights and shadows. In: LOVEMAN, Brian (Ed.). Addicted to failure: U.S. security policy in Latin America and the Andean region. Lanham: Rowman & Littlefield Publishers, 2006. p. 53-79.

ROJAS Guevara, Pedro Javier. Doctrina Damasco: eje articulador de la segunda gran reforma del Ejército Nacional de Colombia. Revista Científica General José María Córdova, v. 15, n. 19, p.95-119, 2017. Escuela Militar de Cadetes José María Córdova.

ROJAS, Diana Marcela. El Plan Colombia: la intervención de Estados Unidos en el conflicto armado colombiano (1998-2012). Bogotá: IEPRI, 2015.

TICKNER, Arlene B.; MORALES, Mateo. Cooperación dependiente asociada: Relaciones estratégicas asimétricas entre Colombia y Estados Unidos. Colombia Internacional, Bogotá, v. 1, n. 85, p.171-205, 2015.

 

Peregrinación por la paz y la defensa de la vida

Alejo Vargas Velásquez

Texto originalmente publicado na Revista Sur

https://www.sur.org.co/peregrinacion-por-la-paz-y-la-defensa-de-la-vida/

 

Los dirigentes y excombatientes de las extintas FARC, en su calidad de signatarios del Acuerdo de Paz, ante la continuación del asesinato de los exguerrilleros en proceso de reincorporación –ya van 238 asesinados desde cuando se firmó el Acuerdo-, tomaron una decisión política valerosa, a pesar de lo dolorosa: iniciar una peregrinación hacia la capital del país, desde varios de los Espacios Territoriales en que han venido adelantando sus procesos de reincorporación en lo económicos, lo social y lo político. La iniciaron el 21 de octubre en Mesetas, después del asesinato y sepelio de uno de sus líderes conocido como ‘Albeiro Suarez’. A la misma se sumaron delegaciones de excombatientes con sus familias de Guaviare, Meta, Antioquia, Choco, el Eje Cafetero, La Guajira, Cesar, Arauca, Norte de Santander, Sur de Bolívar Y efectivamente después de cerca de dos semanas de desplazamiento colectivo, combinando caminatas y trayectos en vehículos, llegaron a la capital del país el 1 de noviembre.

Es importante resaltar la denominación que le dieron a esta movilización de protesta, más que justificada, una ‘peregrinación’, porque se trata en lo fundamental de una expresión usada en el ámbito religioso, especialmente por las tres grandes religiones monoteístas, el cristianismo, el judaísmo y el islamismo para dirigirse por parte de un grupo de creyentes hacia un santuario o un sitio de especial relevancia para ellos, pero también realizada por excluidos o expatriados, para significar con ello, los miembros de ese especie de ‘movimiento social en construcción de los firmantes del Acuerdo de Paz’, como lo recalcaron varios de sus dirigentes, que no se trataba de buscar la selva como en el pasado de su lucha armada, sino justamente darle la espalda a la selva y marchar hacia el centro del poder político del país, para pedir en forma pacífica, de ese poder político nacional soluciones, especialmente la de salvaguardar sus vidas, pero también la de dar respuesta a derechos básicos y demandas que no fueron incluidas en los acuerdos, como el tema de vivienda o tierra para los antiguos miembros de la guerrilla, pero ahora desmovilizados y en proceso de reincorporación, tienen todo el derecho como cualquier poblador rural.

La ‘peregrinación’ permitió, además, que muchos colombianos del común, situados en las rutas que siguieron los distintos grupos de caminantes, no sólo se sensibilizaran acerca de la situación que estaban viviendo, quienes le están jugando limpio a la paz, sino adicionalmente tener la oportunidad los excombatientes de explicar la gravedad del drama que han estado viviendo: En un sitio cercano a Villavicencio conocido como Pipiral, hicieron un acto simbólico de perdón por los secuestros masivos –conocidos como ‘las pescas milagrosas’- con una bandera blanca clavada en la tierra, en esa vía donde sembraron de temor a los viajeros en el pasado; también permitió que gobiernos territoriales igualmente se solidarizaran con los caminantes y contribuyeran a suministrarles sitios de alojamiento, además de apoyos para alimentación, siendo esto especialmente relevante en el gobierno de Bogotá. Pero también era simbólicamente relevante mostrar con la ‘peregrinación’ su condición de excluidos por las políticas de un Estado que justamente se comprometió en los Acuerdos de La Habana y del Teatro Colón a apoyarlos plenamente en su proceso de tránsito de alzados en armas a ciudadanos del común.

Ahora bien, hay que resaltar que estaba claro desde siempre que el proceso de implementación de los Acuerdos era y será, un campo de disputa política con cualquier gobierno que esté al frente de esta tarea –si se priorizaba la desmovilización y reincorporación colectiva o individual, con todas las implicaciones que esto conlleva; cómo iba a ser el enfoque de los programas de desarrollo rural con enfoque territorial, los conocidos PDETs; etc.-, por cuanto es probable que los miembros de las extintas FARC buscaran que en ese proceso de implementación se reflejara su propia visión política de cómo hacerlo y en igual sentido lo haría cualquier gobierno. Eso no es un tema novedoso, era algo plenamente previsible y mucho más cuando la Corte Constitucional al avalar la constitucionalidad y legalidad de los Acuerdos, estableció que era responsabilidad de los siguientes tres gobiernos la implementación, pero en concordancia con las políticas públicas de cada gobierno, dejando allí un margen de maniobra a los gobiernos, pero también de controversia acerca del enfoque de la implementación.

Los cerca de dos mil excombatientes y sus familias hicieron marchas en la ciudad de Bogotá, acompañadas por sectores ciudadanos y especialmente en la Plaza de Bolívar, planteando de manera clara y precisa las razones de su peregrinación, eso sí buscando ser una peregrinación sin alborotos, ni bulliciosa, y por supuesto sin acudir a la violencia. Y se produjo lo que pocos esperaban: el Presidente Duque aceptó recibir una delegación de la ‘peregrinación’. En esto hay que decirlo, jugaron un papel fundamental, el apoyo de la comunidad internacional –la Misión de la ONU, los embajadores de la Unión Europea y los países garantes-, el propio manejo de la ‘peregrinación’ y dos funcionarios del Alto Gobierno que han estado al frente de la implementación y la reincorporación, el Consejero Presidencial para la Estabilización y Consolidación, Emilio Archila y el Director de la Agencia de Reincorporación, Andrés Felipe Stapper, quienes estuvieron pendientes de la peregrinación y de buscar salidas positivas a la misma.

Efectivamente el viernes 6 de noviembre el presidente Duque recibió en la Casa de Nariño, junto con los funcionarios Archila y Stapper, a una delegación de siete líderes de la ‘peregrinación’ –uno por cada región donde están los procesos de reincorporación-, encabezada por Pastor Alape el delegado ante el Consejo Nacional de Reincorporación (CNR). Esta reunión, que fue un desayuno de trabajo, se llevó a cabo en un ambiente amable entre las dos partes y se llegaron a unos puntos de acuerdo. Pero lo más relevante, desde el punto de vista simbólico, fue el inicio del desmonte de la estigmatización que hasta el momento se ha dado a los firmantes del Acuerdo, expresado en el hecho mismo de la reunión con el jefe de Estado.

Es necesario resaltar la actitud positiva de apoyo a la reincorporación de los excombatientes, por parte del Presidente. Así como su compromiso en que se acelere el proceso de definir la asignación de tierras y vivienda para los firmantes del Acuerdo y una reunión con la Ministra del Interior, el Viceministro y el director de la Unidad Nacional de Protección (UNP) para revisar requerimientos de seguridad y los dispositivos estatales en esa dirección. Igualmente se acordó realizar siete reuniones territoriales, con la participación de los firmantes del Acuerdo en los territorios para valorar el proceso de implementación y las necesidades que tienen ellos y cómo darles respuesta. Igualmente insistieron los delegados de los firmantes del Acuerdo, en la importancia de estructurar un ‘sistema integral de reincorporación’ que articule la acción de los diversos entes estatales.

No hay duda que fue una iniciativa novedosa la adelantada por los firmantes del Acuerdo de Paz, donde lo más relevante va a ser comenzar a mostrarse como parte de ese ‘movimiento social en construcción de los firmantes’, que se manifiesta por sus derechos y demandas derivadas del Acuerdo, del cual fueron signatarios y acudiendo a formas novedosas de visibilización de las cuales está claramente ausente el uso de la violencia, ni simbólica ni real, mostrando así el contraste de anteriores hombres guerreros que ahora actúan como constructores de paz.

 

 

Alejo Vargas Velásquez é Director del Centro de Pensamiento y Seguimiento al Diálogo de Paz – UN

 

Imagem: Colombia Fighting for Peace

Por: Leon Hernandez

Operação do SOUTHCOM no Caribe: objetivos políticos das operações antidrogas dos EUA

João Estevam dos Santos Filho

Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP). Membro do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (GEDES).

 

No dia primeiro de abril de 2020, a administração de Donald Trump anunciou a implementação de uma operação antidrogas no Mar do Caribe, com a finalidade de impedir que os cartéis presentes na região aproveitassem a situação de pandemia do COVID-19 para aumentar a comercialização de drogas. Assim como em outras operações antinarcóticos lideradas pelos EUA, esta também é organizada pelo Comando Sul (SOUTHCOM), responsável pera área que vai da América Central ao sul do continente. A operação conta com embarcações de combate e de patrulhamento costeiro, helicópteros de apoio e de combate, bem como aeronaves de inteligência, resultando em um aumento expressivo no número de equipamentos utilizados no Mar do Caribe e no Pacífico Oriental.

Por outro lado, também participam forças de países da região andina (Colômbia) e centro-americana (Costa Rica, El Salvador, Guatemala, Honduras e Panamá) – como parte da Força Tarefa Conjunta Interagências – Sul, e de países europeus, que contribuiriam com apoio de inteligência. Além disso, é coordenada com outras agências de segurança norte-americanas, como a Alfândega e Proteção de Fronteiras e a Administração de Fiscalização de Drogas.

Outro componente importante dessa operação é o envio de efetivos do Exército dos EUA para a Colômbia. Trata-se de 48 militares da Brigada de Assistência de Força de Segurança, trabalhando no SOUTHCOM, destinados a apoiar operações contra o narcotráfico desempenhadas pelas Forças Armadas colombianas, através de assessoramento técnico e treinamento em áreas como logística, serviços e inteligência, atuando também no intercâmbio de informações entre EUA e Colômbia. O tempo da presença desses efetivos será inicialmente de quatro meses, sujeito a ampliação. Essa missão mlitar – a primeira na América Latina – tem sido objeto de discussões entre membros dos três Poderes da Colômbia: por um lado, os críticos dessa presença afirmam que é necessária a autorização do Congresso colombiano; entretanto, o governo de Iván Duque nega essa necessidade pelo fato de não ser o caso de tropas que atuarão em combate no país. Apesar dessas controvérsias, a presença das tropas estadunidenses não foi revogada, tendo suas atividades sido reiniciadas.

Esses eventos se dão num contexto de intensificação da crise política venezuelana, tendo o Departamento de Justiça norte-americano acusado Nicolás Maduro de tráfico internacional de drogas, oferecendo uma recompensa de US$15 milhões por informações a fim de condená-lo à prisão. Também foram acusados de tráfico outros membros do governo, como o ministro da Defesa, o ex-diretor da inteligência militar e o ministro de Indústria e Produção Nacional; no caso destes, o governo norte-americano oferece US$10 milhões por informações que levem os à prisão. Além disso, em maio deste ano, foi desarticulada uma operação conduzida por mercenários norte-americanos e dissidentes militares venezuelanos para derrubar e apreender Maduro. Apesar de não haver provas de participação de autoridades políticas dos EUA, esse foi um acontecimento que demarcou o clima de tensão entre os dois governos.

Apesar de oficialmente não ser dirigida contra o governo de Nicolás Maduro, a recente operação antidrogas é mais um episódio nas relações entre EUA e América Latina que demonstra o caráter político das iniciativas contra o narcotráfico promovidas pelo Estado norte-americano. A justificativa de combate às drogas também foi utilizada para a intervenção militar no Panamá em 1989 (com a apreensão do presidente do país, Manuel Noriega, que foi condenado e preso nos EUA). A elaboração e execução do Plano Colômbia também teria ocorrido para promover os interesses de membros das elites políticas norte-americanas e colombianas ligados a empresas transnacionais, com interesses no combate aos grupos guerrilheiros (STOKES, 2005). O interesse em construir um ambiente minimamente estável para os investimentos de empresas transnacionais também teria guiado a implementação da Iniciativa Mérida no México (MERCILLE, 2011; AVILÉS, 2017).

Assim, a operação antidrogas promovida pelo Comando estadunidense parece oferecer mais uma fonte de pressão política contra o governo de Nicolás Maduro. Apesar de não significar uma intervenção, como no caso panamenho, essa ação militar implica em uma tentativa de intimidação, bem como uma justificativa para o estacionamento de recursos perto do mar territorial venezuelano. Desse modo, o episódio lança luz para o modo como as iniciativas de combate às drogas, segundo o discurso de “guerra às drogas” – promovida pelas sucessivas administrações norte-americanas desde a década de 1970 – possuem um caráter fortemente político, sendo usado para deslegitimar os oponentes e justificar ações mais “duras”.

Por outro lado, também cabe ressaltar o papel que a Colômbia ainda desempenha nas ações norte-americanas voltadas para a região. Desde o início da década de 2010, com o enfraquecimento das guerrilhas, o governo colombiano tem oferecido seus recursos a fim de contribuir com a política de segurança estadunidense para a América Latina, como no caso do treinamento de forças de segurança de países centro-americanos e caribenhos conforme o know-how deixado pelo Plano Colômbia. Essa situação, por sua vez, implica em uma continuidade da dependência colombiana na área de segurança (TICKNER; MORALES, 2016). Nessa situação, o país andino busca desempenhar o papel de aliado dos EUA inclusive em situações de tensão regional. Nesse sentido, o presidente colombiano reuniu-se em Bogotá com Juan Guaidó, autodeclarado presidente interino da Venezuela e Mike Pompeo, secretário de Estado norte-americano na Conferência Hemisférica contra o Terrorismo a fim de discutir a situação venezuelana. Também em outra ocasião, o presidente colombiano comprometeu-se com o governo norte-americano em “restaurar a democracia” na Venezuela em uma reunião anterior ao encontro do Grupo de Lima – criado para pressionar a administração de Maduro.

Portanto, a operação antidrogas comandada pelo SOUTHCOM demonstra o uso político do combate ao narcotráfico pelo Estado norte-americano na América Latina, como também ocorreu nos casos do Panamá, da Colômbia e do México. Ademais, também mostra como, para a realização dessas ações, são utilizados aliados regionais, como é o caso da Colômbia, que deu continuidade a sua inserção internacional dependente em relação aos EUA, contribuindo para a realização dos objetivos políticos da grande potência na região.

 

Referências bibliográficas

AVILÉS, W. The drug war in Latin America : hegemony and global capitalism. Abingdon, Oxon ; New York, Ny: Routledge, 2017.

MERCILLE, J. Violent Narco-Cartels or US Hegemony? The political economy of the ‘war on drugs’ in Mexico. Third World Quarterly, [S. l.], v. 32, n. 9, p. 1637–1653, 2011.

TICKNER, Arlene; MORALES, Mateo. Cooperación dependiente asociada: Relaciones estratégicas asimétricas entre Colombia y Estados Unidos. Colombia Internacional, Bogotá, v. 1, n. 85, p.171-205, 2016.

STOKES, D. America’s other war: Terrorizing Colombia. Londres: Zed Books, 2005.

 

Imagens: https://www.southcom.mil

O conflito armado na Colômbia

Leonardo Rodrigues Taquece: Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP) e bolsista CAPES. E-mail: taquece@gmail.com

Maria Aparecida Felix Mercadante: Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago Dantas (UNESP, UNICAMP, PUC-SP) e bolsista CAPES. E-mail: mariaamercadante@hotmail.com

 

O conflito na Colômbia é um dos mais antigos da América Latina. Os episódios de violência se sustentam em um quadro duradouro de enfrentamentos entre diferentes grupos armados – guerrilhas insurgentes, grupos narcotraficantes, grupos paramilitares e grupos de delincuencia organizada (GAO) – entre si e, também, contra as forças do governo. Assim, cabe destacar que em cada região, cada departamento e em cada cidade, a interação entre os atores envolvidos e a intensidade dos conflitos combinaram-se e se desenvolveram muitas vezes com dinâmicas distintas e temporalidades diferentes. Um dos confrontos mais conhecidos é o que ocorre entre o governo colombiano e as Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia – Ejército del Pluebo (FARC-EP) e quem tem início na década de 1960.

O surgimento das FARC-EP e o desenvolvimento da violência política na disputa pelo poder estão historicamente enraizados na cultura bipartidarista, oriunda do processo de independência da Colômbia, e nos confrontos ligados às disputas eleitorais do período. O progresso da violência entre o Partido Liberal e o Partido Conservador se desdobra no período La Violencia entre, aproximadamente, os anos de 1948 e 1958. Ainda que todas as regiões do país tenham sofrido de algum modo as consequências do imaginário político polarizado, as áreas rurais foram as mais afetadas pela violência armada, contribuindo para o desenvolvimento de movimentos de resistência campesina ou autodefensas – embriões dos futuros movimentos guerrilheiros (BUSHNELL, 2007; GRUPO DE MEMORIA HISTÓRICA, 2013).

De acordo com a narrativa oficial das FARC-EP, seu surgimento deve-se à exclusão política e aos ataques do Exército Nacional contra o que ficou conhecido como “Repúblicas Independientes”, zonas criadas por camponeses deslocados de suas antigas terras e que por via armada se colocavam à parte do controle estatal. Formadas por Charro Negro, Manuel Marulanda e Ciro Trujillo, as zonas de colonização campesina armada reforçavam os conceitos de ameaça à segurança interna no contexto de Guerra Fria. O ataque à Marquetalia e às demais colônias agrícolas, em 1964, se torna-se o marco de criação do grupo guerrilheiro, o porquê de a origem ter se dado nessa região estaria ligado a dois litígios históricos: a luta de indígenas pela posse da terra e a luta de reconhecimento dos direitos políticos por parte dos campesinos (MOLANO, 2016).

A Conferência Guerrilheira, em 1965, forma o Bloque Sur. O nome Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC) é resultado da segunda conferência guerrilheira no ano de 1966; e, o acréscimo de “Ejército del Pueblo” (-1983. Em seu estatuto, as FARC-EP se definem como um “um movimento político-militar que desenvolve sua ação ideológica, política, organizativa, propagandística e armada de guerrilha, conforme a tática de combinação de todas as formas de luta de massas pelo poder para o povo” (FARC-EP, 1993). Quase concomitante ao desenvolvimento das FARC-EP, ocorre o desenvolvimento de outros grupos guerrilheiros, sendo os mais conhecidos, o Ejército de Liberación Nacional (ELN), Ejército Popular de Liberación (EPL), Movimiento 19 de Abril (M-19) e o movimento indigenista Quintín Lame.

A resposta à ascensão da mobilização social realizada pelas guerrilhas foi evidentemente militar, com a multiplicação das zonas de atuação e a consolidação territorial de grupos paramilitares como força contrainsurgente, especialmente, a partir dos anos 80. A expansão do paramilitarismo combinou com políticas governamentais que possibilitaram esse processo, os grupos paramilitares pertenciam a uma fronteira ambígua entre legalidade e ilegalidade, muitas vezes servindo como força de apoio para as unidades militares do Estado (PÉCAULT, 2008). No grupo paramilitar Muerte a Secuestradores (MAS), por exemplo, uma investigação, em 1983, encontrou que 69 dos 163 membros eram integrantes das Forças Armadas (GRUPO DE MEMORIA HISTÓRICA, 2013, p. 137). A aliança dos grupos paramilitares resultou na formação da Autodefensas Unidas de Colombia (AUC), em 1995, com o objetivo de coordenar as ações contrainsurgentes.

Dada a conjuntura de Guerra Fria em que vivia o sistema internacional, o sucesso da Revolução Cubana, somado ao surgimento de organizações guerrilheiras com ideologias comunistas em território colombiano, contribuiu para que o conflito colombiano se inserisse na lógica internacional – e regional – de combate e contenção ao comunismo. As estratégias de atuação anticomunista dos Estados Unidos no continente americano são bem conhecidas, na Colômbia, a incorporação da doutrina de segurança nacional e a tese do inimigo interno encontraram reforço na exclusão de forças políticas distintas dos partidos tradicionais, justificando as ações repressivas em favor da manutenção da ordem social (GRUPO DE MEMORIA HISTÓRICA, 2013).

Para além das disputas envolvendo as questões militares e ideológicas, a consolidação da economia da droga nas regiões de atuação dos grupos armados e o desenvolvimento dos grandes cartéis – Cartel de Cali e Cartel de Medellín – promoveram o agravamento do conflito colombiano nos anos 80 e 90 (CAMACHO, 2011). Uma das primeiras expressões da vinculação do narcotráfico com as organizações foi o desenvolvimento do narcoparamilitarismo, de modo que os efeitos dessa aliança na luta contrainsurgente tornaram mais complexa a relação entre os atores. Embora as organizações de paramilitares tivessem um caráter antissubverssivo, aliado aos interesses do Estado colombiano, se colocavam, ao mesmo tempo, como inimigas na luta nacional e internacional contra o narcotráfico. Ademais, a economia da droga, progressivamente, somava-se ao sequestro extorsivo como principais fontes de renda para financiar a expansão territorial e militar das guerrilhas, especialmente, das FARC-EP. Os narcotraficantes têm um papel central no conflito colombiano, uma vez que forneciam os recursos econômicos para os demais atores envolvidos (GRUPO DE MEMORIA HISTÓRICA, 2013; TICKNER, GARCÍA e ARREAZA, 2011; PÉCAULT, 2008).

A atuação violenta do Cartel de Medellín merece destaque, uma vez que o cartel foi responsável, em 1989, por alguns dos atentados que marcaram a história da Colômbia: a explosão de um Boeing 727 da Avianca, que deixou 107 mortos, e a  explosão do carro-bomba em frente ao Departamento Administrativo de Seguridad, que deixou ao menos 63 mortos e mais de 600 pessoas feridas. A expansão dos cultivos ilícitos qualificaria a Colômbia como a maior produtora mundial de cocaína e a política nacional de combate ao narcotráfico passaria a ser apoiada na estratégia internacional do governo norte-americano, uma estratégia militarizada de combate à oferta que nasce na “Guerra às Drogas” e se mantém com os programas de ajuda militar do governo norte-americano aos países andinos.

O envolvimento do narcotráfico com a política colombiana e a denúncia do Cartel de Cali ter financiado a campanha presidencial de Ernesto Samper, em 1994, levou à mobilização do conceito de narcodemocracia para referir-se ao país. Fato este que contribuiu para que, mesmo com a posterior desmobilização dos grandes cartéis, a cooperação no campo militar com os Estados Unidos permanecesse sob a justificativa de falta de capacidade do governo colombiano lidar com o problema das drogas e pelo progressivo envolvimento das FARC-EP com o narcotráfico. A campanha contrainsurgente e a campanha antinarcóticos se transformaria em uma só e direcionaria a assistência técnica-militar norte-americana. O Plano Colômbia, em 1999, e a campanha militar do Plano Patriota, em 2003, são exemplos da ofensiva contra as FARC-EP, que sofreria os impactos da modernização das Forças Armadas com perdas significativas de combatentes e territórios (PÉCAULT, 2008). A respeito da estratégia militarizada do período, cabe destacar as execuções extrajudiciais realizadas pelo Exército Nacional, os militares promoviam o assassinato de civis e estes eram apresentados como guerrilheiros. O escândalo que ficou conhecido como ‘falsos positivos‘ tinha como objetivo manipular as estatísticas e mostrar resultados no combate às guerrilhas.

O enfraquecimento militar das FARC-EP, a diminuição dos aportes financeiros norte-americanos após a crise de 2008, a eleição do presidente colombiano Juan Manuel Santos em 2010 e algumas mudanças na política de Defesa e Segurança, orientadas para democracia e desenvolvimento social, são alguns dos fatores que propiciaram o desenvolvimento de uma nova tentativa de resolução do conflito colombiano por meio de processos de paz. Em 2012 são iniciadas mesas de diálogo com as FARC-EP e, em 2014, reuniões exploratórias para o início do diálogo com o ELN. Os diálogos com as FARC-EP resultariam, em 2016, no Acordo Final para a Terminação do Conflito e a Construção de uma Paz Estável e Duradoura firmado entre o governo e a guerrilha em Cuba. As FARC-EP foram convertidas no Partido Força Alternativa Revolucionária do Comum (FARC) e passa então a atuar nos processos eleitorais desde 2017.

A entrega das armas pela guerrilha das FARC, entretanto, não garantiu o fim do problema das drogas nem o fim da violência armada em território colombiano. A Colômbia continua sendo o maior produtor de cocaína do mundo, com cerca de 169.000ha de cultivo de coca no ano de 2018. Os diálogos com o ELN foram encerrados sem Acordo em fevereiro de 2019.  A manutenção dos cultivos permite que as unidades dissidentes das FARC-EP, que não aderiram ao Acordo Final, continuem atuando e que novos grupos armados organizados continuem surgindo e ocupando as zonas estratégicas para operar o narcotráfico, como as Bandas Criminales (Bacrim) ou Grupos de Delincuencia Organizada (GDO) (FUNDACIÓN IDEAS PARA LA PAZ, 2017). Outra questão importante foi o anúncio, em agosto de 2019, da “refundação” da guerrilha FARC-EP e do abandono do processo de reincorporação por parte de alguns de alguns ex-combatentes, incluindo Iván Márquez , ex-chefe negociador do processo de paz de Havana.

De acordo com as estatísticas do Centro Nacional de Memória História da Colômbia, 218,094 pessoas foram mortas entre os anos de 1958 e 2012 sendo 177,307 civis e apenas 40,787 combatentes. Outro dado capaz de mostrar a dimensão da violência gerada pelo conflito colombiano é o registro de vítimas realizado pelo governo, neste registro, 8.944.137 pessoas haviam sido vítimas direta ou indiretamente pelo conflito armado até janeiro de 2020. De acordo com o relatório da Agência da ONU para Refugiados, a Colômbia ocupa desde 2015 a primeira colocação no ranking de países com maiores vítimas de deslocamentos internos, chegando a mais de 7 milhões de pessoas internamente deslocadas (UNHCR, 2019, p. 35).

Com respeito à  manutenção da violência em tempos de “paz”, desde a firma do Acordo Final, tem-se registrado o assassinato sistemático de líderes sociais e de defensores dos direitos humanos em território colombiano, ainda que não haja consenso, uma vez que os métodos empregados para definição de “líderes” são distintos nas organizações, o Instituto de Estudios para el Desarrollo y la Paz aponta que o número de vítimas pode chegar em até 760 pessoas entre 2016 e 2019. Os ex-combatentes das FARC também tem sido vítimas dessa violência, a Misión de Verificación das Naciones Unidas en Colombia (2020) divulgou no último dia 26 de março, que 194 ex-combatentes firmantes dos acordos foram mortos e 13 ex-combatentes estão desaparecidos. O caminho atual parece levar a Colômbia a reviver a história de outra tentativa de participação partidária por parte dos ex-combatentes das FARC-EP: o genocídio contra a União Patriótica nos anos 80.

 

REFERÊNCIAS

 BUSHNELL, David. Colombia: Una nación a pesar de sí misma. Bogotá: Planeta. 2007

CAMACHO, Adriana; MEJÍA, Daniel. Consecuencias de la aspersión aérea en la salud: evidencia desde el caso colombiano. In: ARIAS, Maria; CAMACHO, Adriana; IBÁÑEZ, Ana María; MEJÍA, Daniel; RODRIGUEZ, Catherine. (comp.). Costos Económicos y Sociales del Conflicto en Colombia: ¿Cómo construir un posconflicto sostenible? Bogotá: Universidad de los Andes. 2014.

FARC-EP. Estatuto de las Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia (FARC-EP). 1993. Disponível em: https://www.farc-ep.co/octava-conferencia/estatuto-farc-ep.html. Acesso em: 20 maio 2020.

FUNDACIÓN IDEAS PARA LA PAZ. Crimen organizado y saboteadores armados en tiempos de transición. Bogotá, jul, 2017. Disponível em: ﷟ttp://ideaspaz.org/media/website/FIP_crimenorganizado.pdf. Acesso em: 20 maio 2020.

GRUPO DE MEMÓRIA HISTÓRICA – GMH. ¡BASTA YA! Colombia: Memorias de guerra y dignidad. Bogotá: Imprensa Nacional, 2013. Disponível em: http://centrodememoriahistorica.gov.co/descargas/informes2013/bastaYa/basta-ya-colombia-memorias-de-guerra-y-dignidad-2016.pdf. Acesso em: 20 maio 2020

MISIÓN DE VERIFICACIÓN DAS NACIONES UNIDAS EN COLOMBIA.  Informe trimestral del Secretario General. 26 de março de 2020. Disponível em: https://colombia.unmissions.org/sites/default/files/informe_sg_unvmc_marzo_2020_act._8_abr.pdf. Acesso em: 20 maio 2020.

MOLANO, Alfredo. A lomo de mula: viajes al corazón de las Farc. Bogotá: Aguilar. 2016.

PÉCAUT, Daniel. Las FARC: fuentes de su longevidad y de la conservación de su cohesión. Análisis político [Bogotá], n.63, pp. 22-50, maio./agost. 2008.

ROJAS, Diana. Estados Unidos y la guerra en Colombia. In: INSTITUTO DE ESTUDIOS POLÍTICOS Y RELACIONES INTERNACIONALES. Nuestra guerra sin nombre. Las transformaciones del conflicto en Colombia. Bogotá: Editorial Norma, 2005.

TICKNER, Arlene; GARCÍA, Diego; ARREAZA, Catalina. Actores violentos no estatales y narcotráfico en Colombia. In: GAVÍRIA, Alejandro; MEJÍA, Daniel (comp.). Políticas antidroga en Colombia: éxitos, fracasos y extravíos. Bogotá: Universidad de los Andes. 2011.

UNHCR. The UN Refugee Agency. Global Trends: Forced displacement in 2018. 2019. Disponível em: https://www.unhcr.org/5d08d7ee7.pdf#_ga=2.214246807.1642386792.1589554806-1068563153.1589554806 Acesso em: 20 maio 2020.

 

Imagem: Manifestantes em Bogotá. Fonte: depositphotos